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terça-feira, 23 de setembro de 2014

UM NOME NA VIDRAÇA




A guriazinha
desenha as letras do seu nome na vidraça
- encantadoramente mal feitas -
as letras escorrem...
Enquanto isto,
umas pessoas morrem,
outras nascem...
Entre umas e outras,
viro mais uma página
desta novela policial.
E exatamente à página , verifico,
quando o herói vai torcendo cautelosamente o trinco
da porta,
interrompo
a leitura
e ele e todos os outros personagens ficam parados.
Eu sou o Deus catastrófico: não ligo.
olho agora a litografia da parede
- um trigal muito louro e acima dele apenas uma asa
contra o céu azul.
É como se eu abrisse uma janela na frustração da
chuva!
Bem, neste momento as pessoas já devem ter morrido
ou nascido
A verdade, minha filha,
é que eu não sei como parar este poema:
nos dias de chuva sobem do fundo do mar os navios
fantasmas
sobem ruas, casas, cidades inteiras,
e procissões, manifestações, os primeiros
e os últimos encontros, o padre-cura e o boticário
discutindo política na esquina...
(A guriazinha
apaga as letras lacrimejantes da vidraça.
E recomeça...)

Mario Quintana
In Baú de Espantos

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